Como são os tempos escolares e o que nos dizem?

“Por seres tão inventivo

E pareceres contínuo

Tempo, tempo, tempo, tempo

És um dos deuses mais lindos

Tempo, tempo, tempo, tempo” (Caetano Veloso)

Como falar sobre o tempo senão em forma de oração? Para mim, a beleza e divindade do tempo está também em seus mistérios. Passado, futuro, horas, anos são medidas humanas que não dão conta da complexidade do que é o Tempo e essas contagens inventadas me parecem revelar mais sobre nós do que sobre o tempo em si.

Como são os tempos escolares e o que nos dizem?

Os ritmos da escola são determinados pelo Tempo: a hora de entrada e saída, os cinquenta minutos de aula, a hora do recreio, os calendários das secretarias. Esta institucionalização tira a naturalidade da aprendizagem ao diferenciar o tempo de aprender e o de não aprender. A carga semanal de matérias fragmenta os conhecimentos e os hierarquiza.

Não é possível, contudo, ignorar iniciativas que desestruturam essa escolarização do tempo na educação brasileira hoje. A E.M. Polo de Educação Integrada em Barreiro (MG) é um exemplo de experiência de política pública de Educação Integral e Integrada na Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte. Outro caso é a Rua Adotada do Projeto Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento (CPCD) em Araçuaí. Quando perceberam que muitas crianças moravam na mesma rua, as histórias começaram a ser lidas também sob a sombra das árvores dos quintais.

Ao contrário da maioria das instituições dizer que temos que tirar os meninos da rua, não quero tirá-los de lá, mas sim mudar a rua” (Tião Rocha, idealizador do CPCD)

Como são os tempos no ALC e o que nos dizem?

Aqui percebemos que são vários os tempos que fluem simultaneamente, cada um em um ritmo próprio. Aprendemos a observá-los e a reconhecer os instantes que se tocam para caminhar em harmonia. Eu vejo pelo menos quatro tempos orientando o ALC Nature hoje:

  1. Tempos da Natureza
  2. Tempos Internos
  3. Tempos coletivos
  4. Tempos geracionais
  5. Tempos da Natureza

-A Natureza nos diz a duração das atividades: a preparação do almoço leva o tempo da lenha queimar; os dias no inverno acabam mais cedo que nas demais estações; os obstáculos das estradas de terra e as trilhas das montanhas indicam os tempos de deslocamento

– Os elementos da Natureza são energias que conversam com a temporalidade: o frio do inverno introspectivo nos convida para atividades curtas ao ar livre; a quietude da montanha pede por tempos de silêncio e contemplação; as fases da lua nos ensinam sobre a o tempo cíclico.

2. Tempos internos

Chamo de Tempos Internos o que diz respeito aos tempos de cada indivíduo da comunidade. São tempos:

-dos corpos: corpos saudáveis operam em um ritmo diferente daqueles que sentem dores ou carências; pessoas que menstruam têm tempos marcados pelo seus corpos (e algumas vezes com a sincronicidade com outros corpos menstruantes)

-das emoções: tanto a dimensão íntima — o tempo de escuta interna e cura de cada um — quanto na relação com o coletivo.

-das curiosidades: nossas intenções, pedidos, oferecimentos são construídos a partir do que pulsa internamente (para entender melhor essas ferramentas e a concepção aprendizagem autodirigida, clique aqui).

-das aprendizagens: os ritmos individuais de aprendizagem.

3. Tempos coletivos

Temos autonomia para estabelecer nossos planejamentos, o que significa dizer que esta comunidade firma horários e calendários orientados pelos acordos e interesses coletivos. A principal ferramenta de organização do tempo é o Kanban.

Se escolhemos uma pessoa para facilitar um jogo, é ela a guardiã do tempo e quem decide o seu começo e fim. Se combinamos uma atividade mas na hora ninguém manifesta vontade, ela não acontece.

4. Tempos Geracionais

Hoje no ALC Nature fluem os tempos dos adultos e dos adolescentes.

-Adultos: costuma ser focado mais nas expectativas do futuro e julgamento sobre passado do que no presente; é um tempo imediatista, no sentido de desejo por resultados no instante seguinte; utilitarista, que divide o tempo entre útil e perdido

-Adolescentes: é um tempo com trilha sonora e medido por momentos de alegria e boas memórias. Divide-se entre coisas chatas que se esforçam para encurtar e o que é considerado importante ou prazeroso (em outras palavras, o que faz sentido para eles). O que os adultos chamam falta de foco ou enrolação é o esforço adolescente em se deslocar para os tempos em que estão inteiramente presentes.

Diz o Talmud, fonte da tradição judaica: “Quem é sábio? Aquele que aprende com todos” (Pirkei Avot, Cap 4). É com sabedoria que aprendemos com o Tempo, sem o intuito de controle, mas com humildade e honra perante um Mestre. Como falar sobre o tempo senão em forma de oração?

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