Qual o jeito certo de aprender a cantar?
E se alguém errar ao se comunicar com agressividade?
Quantas vezes é permitido esquecer de pendurar a roupa no varal?
Em uma comunidade de pessoas auto dirigidas, em que temos autonomia para escolher nossas formas de aprender, nos deparamos com a questão: existe certo e errado? Quem os define e como?
Durante a imersão no ALC Nature de Agosto/Setembro de 2020, uma adolescente disse: “aqui eu descobri que gosto de cozinhar, porque não tem minha mãe dando ordens e reclamando que estou errada”. Ela pesquisava dicas na internet, observava as pessoas na cozinha e testava receitas. Sem alguém para determinar o jeito “certo” ou “errado”, ela descobriu na experimentação sua própria maneira de cozinhar. Entendemos que não existe uma única maneira de fazer as coisas, as pessoas têm a liberdade de aprender como aprender, o direito de (se) descobrir e à abertura ao devir.
Isso não significa, contudo, que ao desinstitucionalizar a aprendizagem eliminamos o erro: arroz queimado é inevitável e continua não sendo bom. Quantas vezes pode-se queimar o arroz?
Destacar a relevância do erro na aprendizagem não é uma novidade. Muitas escolas já superaram a associação do erro com fracasso e o reconhecem como parte integrante do processo de aprendizagem. Ele é usado como um instrumento, como um “ponto de referência importante para dirigir as hipóteses para outros caminhos.” (TORRE, 2007, p. 19). Porém a escolarização cria o mito da mensuração dos valores (ILLICH, 1985), o que quer dizer que dentro deste sistema é possível — e necessário — medir a aprendizagem. Seja pelo gabarito da prova; recompensas e punições por comportamentos exemplares ou desviantes; constrangimentos ou responsabilização do aluno pelo fracasso do ensino; na organização escolar e no currículo oculto os valores são quantificados e está fixado o que cabe dentro do “certo” e quantas vezes é permitido errar. Na escola o erro é valorizado, mas nem tanto. Nós perguntamos então: como desenhar as fronteiras?
Não contamos a quantidade de erros nem temos uma figura de poder que o desautorize. Ao invés disso, os limites são estabelecidos internamente, ou seja, são as pessoas desta comunidade que dizem até onde dão conta dos erros dos outros. Como eu me sinto quando alguém não guarda as coisas no lugar ou levanta a voz em uma discussão?
A auto direção muda a perspectiva de olhar e nossas perguntas, onde deixa de fazer sentido o erro quantificável. Não nos importa evitar o erro, garantir resultados, medir, calcular ou comparar os processos individuais. Já dizia Illich (1985): “A aprendizagem que eu prezo é a re-criação imensurável”.
Referências:
Illich, Ivan. Sociedade sem escolas: trad. de Lúcia Mathilde Endlich Orth. Petrópolis, Vozes, 1985. I88p. (Educação e tempo presente, 10).
TORRE, Saturnino de la. Aprender com os erros: o erro como estratégia de mudança. Porto Alegre: Artmed, 2007.